Pegando o gancho de um texto que escrevi há alguns dias “ONDE ESTÃO AS EMPRESAS QUE DISCURSAM SOBRE SAUDE, LONGEVIDADE E IDADISMO?”, publicado recentemente nas redes sociais, gostaria de abordar agora as dificuldades pelas quais a grande maioria dos atletas masters passam quando decidem realizar um Evento ou um Desafio pessoal.
Eu diria que a situação é Kafkiana. Surreal. Conciliar trabalho, treinos, família, ou aposentadorias insuficientes até para as despesas básicas, versus custos altos de inscrições, viagens, hotéis, treinadores, clubes, equipamentos, é um trabalho Hercúleo. A conta nunca fecha.
No Brasil, os serviços de saúde pública são precários obrigando as pessoas a adotarem o sistema de assistência médica privada que nos últimos dois anos tornou-se igualmente inacessível para muitas delas.
Por falta de investimento público em instalações esportivas (piscinas, quadras, salas de ginastica, professores, treinadores distribuídos em bairros e parques públicos), os esportes estão muito longe de serem democráticos. Não estão ao alcance da grande maioria da população.
Isso tem um impacto direto no acesso à saúde e à qualidade de vida ao envelhecer.
Vejamos alguns dados só a título comparativo: na França, segundo uma estimativa feita em 2022 pelo Observatório da Economia Desportiva, todo o setor público, o Estado e as autarquias, financia o esporte cujo valor anual chega a 20 Bilhões de euros (aproximadamente R$ 120 bilhões) para 67 milhões de habitantes dos quais 23,6 milhões têm 60+ anos.
No Brasil, investe-se 750 milhões de reais nos esportes olímpicos e paralímpicos. Ou seja, para os esportes de alto rendimento.
E onde está o investimento da base para a qualidade de vida do cidadão?
O Brasil tem 212 milhões de habitantes dos quais 36 milhões (17%) têm 60+ anos.
Brasil é o 5º país mais sedentário do mundo.
O sedentarismo é a quarta doença que mais causa mortes precoces no mundo.
Por outro lado, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU) e fornecidos pela Unesco no site do Conselho Federal de Educação Física (Confef), comprovou-se que U$ 1,00 investido em esporte corresponde a U$ 3,80 de economia nas ações da saúde.
Não existem estimativas de quantos atletas masters existem no Brasil atualmente.
Sabemos, no entanto, que é um dos segmentos que mais cresce no mundo. Acompanha a curva de crescimento dos idosos.
Ora, se o acesso aos serviços de saúde é ruim, se não há acesso às práticas esportivas, se as aposentarias são insuficientes para dar respaldo ao acesso para a prevenção que vem através dos esportes, como esperar que o país diminua o índice de doenças crônicas e os gastos exorbitantes com tratamentos e medicamentos?
Lamentavelmente, a visão é ainda a de que os esportes funcionam tão somente como diversão, lazer e entretenimento. Hoje, comprovou-se que esporte é remédio.
As empresas deveriam colocar em prática a implantação de atividades físicas para seus colaboradores. Motivos: melhoria da saúde física e mental, reforço do espírito de equipe e coesão, aumento da motivação e da produtividade, diminuição do absenteísmo, diminuição dos custos com saúde. Tais empresas poderiam usufruir de isenções de impostos e de contribuições para o ISS, sob determinadas condições e limites.
Ou poderiam patrocinar os atletas masters para reforçar a credibilidade da marca e transmitir um comprometimento real com Saúde, Longevidade e combate ao Idadismo.
Enquanto nada disso acontece, o esporte para os atletas masters é totalmente elitizado.
Aqueles que não conseguem se enquadrar nessa estrutura privilegiada, fatalmente estão fadados a sofrer revezes com sua saúde física e mental e, consequentemente, com a qualidade da longevidade e da diminuição da autonomia.
Atualmente, vejo inúmeros atletas masters lançando mão do recurso de rifas, ou usando plataforma de crowdfunding (vaquinhas) para captação de recursos, ou ainda vendendo camisetas a fim custear as necessidades mais básicas para a prática esportiva competitiva.
A total falta de apoio aos esportes masters por parte do poder publico e das empresas privadas mostra a inabilidade em conciliar o dito ao feito. Depõem contra a imagem que desejam veicular. Perdem credibilidade. E respeito.
Por outro lado, tira desses atletas a possibilidade de realizar desafios extraordinários que contribuem para a história do esporte do País, o acesso ao bem-estar, a proteção contra as doenças crônicas, a luta para amenizar substancialmente as consequências do envelhecimento, a economia gerada pelo fortalecimento da saúde, a manutenção da capacidade cognitiva e a luta contra o idadismo da qual tanto se fala.
Mas, sobretudo, tira a dignidade de sua própria coletividade ao não perceber que o esporte nada mais é do que o espelho de uma sociedade.